A história começou assim: me deparei por aí com essa foto de uma pichação que, imediatamente, me remeteu a um verso de Jack Spicer que conheço há muitos anos e que, com frequência, me vem à lembrança: “No one listens to poetry”. Destacado do poema e perdido nas confusões da memória, o verso sempre foi, para mim, algo como “Ninguém liga para a poesia”. É mais ou menos assim que ele vem e volta da memória quando algo me faz lembrar que ninguém dá muito ouvido ao que dizem os poetas. Agora, a pichação me fez voltar ao poema todo e, num repente, enviei ao amigo Carlos Felipe Moisés, perito na “alta traição” da traduzir poesia, para que ele, quando possível, trouxesse o poema de Spicer para o português. Não dá para brincar com o Carlos Felipe. Para nossa sorte:
Thing Language
Jack Spicer
This ocean, humiliating in its disguises
Tougher than anything.
No one listens to poetry. The ocean
Does not mean to be listened to. A drop
Or crash of water. It means
Nothing.
It
Is bread and butter
Pepper and salt. The death
That young men hope for. Aimlessly
It pounds the shore. White and aimless signals. No
One listens to poetry.
Língua coisa
[trad. Carlos Felipe Moisés]
Esse mar, humilhante em seus disfarces,
mais valente que tudo.
Ninguém ouve a poesia. O mar
tampouco espera ser ouvido. Uma gota
ou um turbilhão de água. Significa
nada.
É
pão com manteiga,
pimenta e sal. A morte
que os jovens esperam. A esmo
ele golpeia a praia. Brancos, inúteis sinais. Ninguém
ouve a poesia.